Idealizar alguém é condenar-se à decepção
Idealizar alguém é condenar-se a uma sentença de frustração. A lógica é quase cruel: quanto maior a imagem que você fabrica na cabeça, mais dolorosa será a queda quando a realidade se impuser. E ela sempre se impõe. Acontece que não projetamos o outro como ele é, projetamos nossas próprias faltas, nossas carências, nossas fantasias sobre como deveria ser o “outro perfeito”. O problema é que o “outro perfeito” nunca existiu.
A projeção é uma armadilha silenciosa. Colocamos no outro uma aura que não lhe pertence e, inevitavelmente, cobramos dele algo que jamais prometeu ser. Criamos um personagem imaginário, um reflexo distorcido do nosso desejo. E quando o tempo revela que esse personagem não existe, damos o nome de decepção ao que, na verdade, foi apenas ilusão.
As pessoas são só isso: pessoas. Com grandezas e misérias, virtudes e abismos. É quase infantil acreditar que alguém conseguirá sustentar expectativas irreais. Quem idealiza se coloca na posição de criança que espera heróis perfeitos, esquecendo que o humano não foi feito de mitos, mas de falhas inevitáveis.
O ponto é que insistimos em buscar perfeição. Desde cedo, vendem-nos a ideia do amor perfeito, da amizade perfeita, do líder perfeito. Mas perfeição é uma das utopias mais cruéis: não apenas não existe, como destrói qualquer chance de amadurecimento. Exigir perfeição é querer moldar o mundo a um padrão impossível.
Idealizar alguém é viver contra a natureza. E a natureza nunca foi perfeita: rios transbordam, montanhas desmoronam, corpos adoecem. Ainda assim, tudo segue seu curso. Por que esperar que as pessoas sejam diferentes? Amar, respeitar, conviver — tudo isso só é possível quando aceitamos que a imperfeição não é defeito, mas condição da vida.
Olhar para o outro com os pés no chão é libertador. A idealização sufoca; a realidade, ao contrário, nos permite respirar. Quando paramos de exigir mais do que o outro pode oferecer, conseguimos enxergar quem ele realmente é. Só então nasce a possibilidade de vínculo verdadeiro — não entre personagens fictícios, mas entre duas existências reais tentando se encontrar.
Maturidade é abandonar o culto ao “ideal” e abraçar o “real”. Isso não significa se conformar com pouco, mas compreender que apenas no terreno concreto algo floresce. Utopias são belas nos livros, mas, nos relacionamentos, funcionam como veneno lento.
Em qualquer tipo de relação — amorosa, de amizade ou profissional — a lógica é a mesma: quem idealiza sofre, quem aceita amadurece. Quanto mais tentamos moldar alguém ao nosso desejo, mais distante essa pessoa se torna. Quanto mais aceitamos, mais próximos ficamos dela.
Talvez a grande tragédia humana não seja a imperfeição alheia, mas a nossa dificuldade em suportar o real. Vivemos na ficção da mente porque é mais confortável que encarar a crueza da vida como ela é. Mas essa fuga sempre cobra um preço: a eterna sensação de descompasso.
Idealizar, no fim das contas, é um ato de covardia. É negar-se a lidar com a verdade de que todos somos limitados, falhos e, justamente por isso, humanos. E só quando essa ficha cai conseguimos viver relações mais sensatas, maduras e concretas. O resto não passa de devaneio — e devaneio, mais cedo ou mais tarde, implode.
Texto autoral de Maycon de Souza
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