A "confortável" compulsão moderna


O mundo está cada vez mais tecnológico e digital, sempre aberto ao surgimento de inovações e produtos que, em tese, visam facilitar nosso dia a dia e nos trazer maior comodidade e conforto. As invenções digitais estão sempre nos surpreendendo, nos oferecendo praticidade e entretenimento que há alguns anos atrás, era impossível imaginar que hoje existiria. Até aí tudo bem, não há problema algum haver tecnologias que nos auxiliem e que nos poupem de gastos de tempo e energia desnecessários, a questão é: até que ponto estes meios são realmente úteis e não nos causam prejuízos emocionais, psicológicos e até mesmo físicos?

Hoje, alguns dispositivos eletrônicos - mais especificamente os smartphones - se tornaram uma extensão do corpo humano. As pessoas, não importa aonde quer que elas vão, sempre carregam consigo esses aparelhos. A simples posse destes não seria nociva se não fosse acompanhada pela compulsão viciante e insana em manuseá-los o tempo inteiro, seja tirando fotos, navegando nas redes sociais, fazendo pesquisas aleatórias sem nenhum interesse específico, etc. Tal situação ocasiona uma grande dependência psicológica e emocional, podendo até ser equiparada à dependência química, haja vista que, conforme sugere estudos científicos, as ações exercidas no cérebro são similares.

Quando os meios digitais ainda não eram tão desenvolvidos, percebia-se uma interação mais profunda entre as pessoas. O famoso “olho no olho” era mais valorizado e as relações interpessoais possuíam um aspecto mais sólido. Hoje, o contato humano está cada vez mais inflacionado, não há uma vontade de adentrar no universo do outro, apenas um simples observar superficial já é o suficiente para alguém formar uma concepção acerca do seu semelhante e assim dar sua sentença sobre ele. Os meios digitais trouxeram à tona o famoso “viver de aparências”, onde sobrevive aquele que melhor consegue criar uma imagem aceitavelmente bonita aos olhos do mainstream.

Uma vez em que a utilização de eletrônicos  torna-se vício, fica difícil livrar-se dele, por isso, além de importante, é extremamente necessário que seja revisto o quanto antes a sua forma de consumo e que haja uma reflexão se há uma real necessidade que justifique a utilização e a frequência com que se faz uso destes.

Posso não conhecer a todos que estão me lendo neste momento, mas afirmo categoricamente que a maioria faz uso desnecessário e excessivo dos meios digitais, podendo os próprios envolvidos chegar à essa conclusão através de uma reflexão crítica e sensata. Após esse diagnóstico, é possível enxergar uma quantidade enorme de tempo e energia desperdiçada que poderia ser utilizada em outras atividades mais benéficas.

Em um futuro não tão distante, arrisco a dizer que a compulsão (ou vício, como preferir) por tecnologia e dispositivos eletrônicos será tratado como doença por profissionais da saúde. É notório cada vez mais observarmos pessoas deixando de viver suas vidas de modo orgânico e real em detrimento do digital, criando assim uma vida paralela à verdadeira.
Em períodos de ascensão digital, a busca pelo equilíbrio deve ser constante e, de tempos em tempos, deve-se avaliar se a quantidade de tempo gasto com tais dispositivos é de fato necessária, sempre buscando maneiras de eliminar ao máximo a utilização supérflua, dando ênfase ao indispensável. Teorizar esse minimalismo digital é muito fácil, é absolutamente compreensível o apego exacerbado à tecnologia, afinal, vivemos sob a iminência de um estágio superior à revolução tecnológica (se é que não estamos vivendo-o sem perceber). Nem tudo que é compreensível é saudável, por isso é imprescindível que não se meça esforços para que a intenção de minorar o consumo saia do campo das ideias e torne-se práticas diárias, ainda que isso requeira abrir mão da zona de conforto e da letargia que, inconscientemente, fazemos questão de manter no dia a dia.

Texto autoral de Maycon de Souza

Comentários

  1. Excelente texto!
    Hoje em dia há apps que foram pensados para minimizar estes transtornos, mas são apps. O usuário sempre volta a ficar com o smartphone nas mãos. É um ciclo vicioso.
    Parabéns pelo trabalho!

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